Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
Lutero em 1529 por Lucas Cranach
Nome completo Martinus Luter (Martin Luther)
Nascimento 10 de novembro de 1483
Eisleben
Sacro Império Romano-Germânico
Morte 18 de fevereiro de 1546 (62 anos)
Eisleben
Sacro Império Romano-Germânico
Cônjuge Catarina von Bora (1499-1552)
Ocupação teólogo
Assinatura
Martinho Lutero, em alemão Martin Luther, (Eisleben, 10 de novembro de 1483 — Eisleben, 18 de fevereiro de 1546) foi um sacerdote católico agostiniano e professor de teologia germânico que foi figura central da Reforma Protestante. Que ficando contra os conceitos da Igreja Católica veementemente contestando a alegação de que a liberdade da punição de Deus sobre o pecado poderia ser comprada, confrontou o vendedor de indulgências Johann Tetzel com suas 95 Teses em 1517. Sua recusa em retirar seus escritos a pedido do Papa Leão X em 1520 e do Imperador Carlos V na Dieta de Worms em 1521 resultou em sua excomunhão pelo Papa e a condenação como um fora-da-lei pelo imperador do Sacro Império Romano Antigo.
Lutero ensinava que a salvação não se consegue com boas ações, mas é um livre presente de Deus, recebida apenas pela graça, através da fé em Jesus como único redentor do pecador. Sua teologia desafiou a autoridade papal na Igreja Católica Romana, pois ele ensinava que a Bíblia é a única fonte de conhecimento divinamente revelada1 e opôs-se ao sacerdotalismo, por considerar todos os cristãos batizados como um sacerdócio santo.2 Aqueles que se identificavam com os ensinamentos de Lutero eram chamados luteranos.
Sua tradução da Bíblia para o alemão, que não o latim fez o livro mais acessível, causando um impacto gigantesco na Igreja e na cultura alemã. Promoveu um desenvolvimento de uma versão padrão da língua alemã, adicionando vários princípios à arte de traduzir3 , e influenciou a tradução para o inglês da Bíblia do Rei James.4 Seus hinos influenciaram o desenvolvimento do ato de cantar em igrejas.5 Seu casamento com Catarina von Bora estabeleceu um modelo para a prática do casamento clerical, permitindo o matrimônio de padres protestantes.6
Em seus últimos anos, Lutero tornou-se algo antissemita, chegando a escrever que as casas judaicas deveriam ser destruídas, e suas sinagogas queimadas, dinheiro confiscado e liberdade cerceada. Essas afirmações fizeram de Lutero uma figura controversa entre muitos historiadores e estudiosos. Há relatos de que momentos antes de sua morte Lutero estava com um rosário em sua mão.7
Primeiros anos de vida
Martinho Lutero, cujo nome em alemão era Martin Luther ou Luder, era filho de Hans Luther e Margarethe Lindemann. Mudou-se para Mansfeld, onde seu pai dirigia várias minas de cobre. Tendo sido criado no campo, Hans Luther desejava que seu filho viesse a se tornar um funcionário público, melhorando, assim, as condições da família. Com esse objetivo, enviou o já velho Martinho para escolas em Mansfeld, Magdeburgo e Eisenach.
Aos dezessete anos, em 1501, Lutero ingressou na Universidade de Erfurt, onde tocava alaúde e onde recebeu o apelido de O Filósofo. Ainda na Universidade de Erfurt, estudou a filosofia nominalista de Ockham (as palavras designam apenas coisas individuais; não atingem os “universais”, as realidades presentes em todos os indivíduos, como por exemplo a natureza humana; em consequência, nada pode ser conhecido com certeza pela razão natural, exceto as realidades concretas: esta pessoa, aquela coisa). Esse sistema dissolvia a harmonia multissecular entre a ciência e a fé que tanto havia sido defendida pela escolástica de "São Jesus Cristo", pois essa filosofia baseava-se unicamente na vontade de Deus. O jovem estudante graduou-se bacharel em 1502 e concluiu o mestrado em 1505, sendo o segundo entre dezessete candidatos.8 Seguindo os desejos maternos, inscreveu-se na escola de direito da mesma universidade. Mas tudo mudou após uma grande tempestade com descargas elétricas, ocorrida naquele mesmo ano (1505): um raio caiu próximo de onde ele estava passando, ao voltar de uma visita à casa dos pais. Aterrorizado, teria, então, gritado: "Ajuda-me, Sant'Ana! Eu me tornarei um monge!"
Tendo sobrevivido aos raios, deixou a faculdade, vendeu todos os seus livros, com exceção dos de Virgílio, e entrou para a ordem dos Agostinianos, de Frankfurt, a 17 de julho de 1505.9
[editar]Vida monástica e acadêmica
Lutero com a tonsura monástica.
O jovem Martinho Lutero dedicou-se por completo à vida no mosteiro, empenhando-se em realizar boas obras a fim de agradar a Deus e servir ao próximo através de orações por suas almas. Dedicou-se intensamente à meditação, às autoflagelações, às muitas horas de oração diárias, às peregrinações e à confissão. Quanto mais tentava ser agradável ao Senhor, mais se dava conta de seus pecados10
Johann von Staupitz, o superior de Lutero, concluiu que o jovem necessitava de mais trabalhos, para afastar-se de sua excessiva reflexão. Ordenou, portanto, ao monge que iniciasse uma carreira acadêmica. Em 1507, Lutero foi ordenado sacerdote. Em 1508, começou a lecionar teologia na Universidade de Wittenberg. Lutero recebeu seu bacharelado em estudos bíblicos em 19 de março de 1508. Dois anos depois, visitou Roma, de onde regressou bastante decepcionado.11
Em 19 de outubro de 1512, Martinho Lutero graduou-se Doutor em Teologia e, em 21 de outubro do mesmo ano, foi "recebido no Senado da Faculdade Teológica" com o título de "Doutor em Bíblia". Em 1515, foi nomeado vigário de sua ordem tendo sob sua autoridade onze monastérios.
Durante esse período, estudou grego e hebraico, para aprofundar-se no significado e origem das palavras utilizadas nas Escrituras - conhecimentos que logo utilizaria para a sua própria tradução da Bíblia.
[editar]A controvérsia acerca das indulgências
Além de suas atividades como professor, Martinho Lutero ainda colaborava como pregador e confessor na igreja de Santa Maria, na cidade. Também pregava habitualmente na igreja do Castelo (chamada de "Todos os Santos" - porque ali havia uma coleção de relíquias, estabelecidas por Frederico III da Saxônia). Foi durante esse período que o jovem sacerdote se deu conta dos problemas que o oferecimento de indulgências aos fiéis, como se esses fossem fregueses, poderia acarretar.
A indulgência é a remissão (parcial ou total) do castigo temporal imputado a alguém por conta dos seus pecados (aplicável apenas a alguém que esteja em estado de graça, ou seja, livre de pecados graves, e arrependido de todos os seus pecados veniais. Naquele tempo, o papa havia concedido uma indulgência plenária para quem doasse qualquer quantia para a reforma da Basílica de São Pedro. O frade Johann Tetzel fora recrutado para viajar através dos territórios episcopais do arcebispo Alberto de Mogúncia, mas sua campanha tomou a linha de uma venda, pois este frade, posteriormente punido por isso, dizia que "Assim que uma moeda tilinta no cofre, uma alma sai do Purgatório".12
Lutero viu este tráfico de indulgências como um abuso que poderia confundir as pessoas e levá-las a confiar apenas nas indulgências, deixando de lado a confissão e o arrependimento verdadeiros. Proferiu, então, três sermões contra as indulgências em 1516 e 1517. Segundo a tradição, em 31 de outubro de 1517 foram afixadas as 95 Teses na porta da Igreja do Castelo de Wittenberg, com um convite aberto ao debate sobre elas. Essas teses condenavam o que Lutero acreditava ser a avareza e o paganismo na Igreja como um abuso e pediam um debate teológico sobre o que as Indulgências significavam. Para todos os efeitos, contudo, nelas Lutero não questionava diretamente a autoridade do Papa para conceder as tais indulgências.
As 95 Teses foram logo traduzidas para o alemão e amplamente copiadas e impressas. Ao cabo de duas semanas se haviam espalhado por toda a Alemanha e, em dois meses, por toda a Europa. Este foi o primeiro episódio da História em que a imprensa teve papel fundamental, pois facilitou a distribuição simples e ampla do documento.
[editar]A resposta do Papado
Depois de fazer pouco caso de Lutero, dizendo que ele seria um "alemão bêbado que escrevera as teses", e afirmando que "quando estiver sóbrio mudará de opinião"13 o Papa Leão X ordenou, em 1518, ao professor de teologia dominicano Silvestro Mazzolini que investigasse o assunto. Este denunciou que Lutero se opunha de maneira implícita à autoridade do Sumo Pontífice, quando discordava de uma de suas bulas. Declarou ser Lutero um herege e escreveu uma refutação acadêmica às suas teses. Nela, mantinha a autoridade papal sobre a Igreja e condenava as teorias de Lutero como um desvio e uma apostasia.
Lutero replicou de igual forma (academicamente), dando assim início à controvérsia.
Enquanto isso, Lutero tomava parte da convenção dos agostinianos em Heidelberg, onde apresentou uma tese sobre a escravidão do homem ao pecado e a graça divina. No decorrer da controvérsia sobre as indulgências, o debate se elevou até o ponto de duvidar do poder absoluto e autoridade do Papa, pois as doutrinas de "Tesouraria da Igreja" e "Tesouraria dos Merecimentos", que serviam para reforçar a doutrina e venda e das indulgências, haviam se baseado na bula papal "Unigenitus", de 1343, do Papa Clemente VI. Por causa de sua oposição a esta doutrina, Lutero foi qualificado como heresiarca e o Papa, decidido a suprimir por completo os seus pontos de vista, ordenou que ele fosse chamado a Roma, viagem que deixou de ser realizada por motivos políticos.
Lutero, que anteriormente professava a obediência implícita à Igreja, negava agora abertamente a autoridade papal e apelava para que fosse realizado um Concílio. Também declarava que o papado não formava parte da essência imutável da Igreja original.
Desejando manter relações amistosas com o protetor de Lutero, Frederico, o Sábio, o Papa engendrou uma tentativa final de alcançar uma solução pacífica para o conflito. Uma conferência com o representante papal Karl von Miltitz em Altenburg, em janeiro de 1519, levou Lutero a decidir guardar silêncio, tal qual seus opositores. Também escreveu uma humilde carta ao Papa e compôs um tratado demonstrando suas opiniões sobre a Igreja Católica. A carta nunca chegou a ser enviada, pois não continha nenhuma retratação; e no tratado que compôs mais tarde, negou qualquer efeito das indulgências no Purgatório.
Quando Johann Ecko desafiou um colega de Lutero, Andreas Carlstadt, para um debate em Leipzig, Lutero juntou-se à discussão (27 de junho-18 de julho de 1519), no curso do qual negou o direito divino do solidéu papal e da autoridade de possuir o as chaves do Céu que, segundo ele, haviam sido outorgadas apenas ao próprio Apóstolo Pedro, não passando para seus sucessores.14 15 Negou que a salvação pertencesse à Igreja Católica ocidental sob a autoridade do Papa, mas que esta se mantinha na Igreja Ortodoxa, do Oriente. Depois do debate, Eck afirmou que forçara Lutero a admitir a semelhança de sua própria doutrina com a de João Huss, que havia sido queimado na fogueira da Inquisição. Alguns meses após a chegada dos cardeais vindos de Roma, Martinho Lutero, monge da Igreja Católica, doutor em Humanidades pela Universidade de Erfurt e professor da Universidade de Wittenberg.
[editar]Aumenta a cisão
[editar]Lutero durante os acontecimentos
Martinho Lutero.
Não parecia haver esperanças de entendimento. Os escritos de Lutero circulavam amplamente, alcançando França, Inglaterra e Itália, em 1519, e os estudantes dirigiam-se a Wittenberg para escutar Lutero que, naquele momento, publicava seus comentários sobre a Epístola aos Gálatas e suas "Operationes in Psalmos" (Trabalho nos Salmos).
As controvérsias geradas por seus escritos levaram Lutero a desenvolver suas doutrinas mais a fundo, e o seu "Sermão sobre o Sacramento Abençoado do Verdadeiro e Santo Corpo de Cristo, e suas Irmandades", ampliou o significado da Eucaristia para incluir também o perdão dos pecados e ao fortalecimento da fé naqueles que a recebem. Além disso, ele ainda apoiava a realização de um concílio a fim de restituir a comunhão.
O conceito luterano de "igreja" foi desenvolvido em seu "Von dem Papsttum zu Rom" (Sobre o Papado de Roma), uma resposta ao ataque do franciscano Augustin von Alveld, em Leipzig (junho de 1520). Enquanto o seu "Sermon von guten Werken" (Sermão das Boas Obras), publicado na primavera de 1520, era contrário à doutrina católica das boas obras e dos atos como meio de perdão, mantendo que as obras do crente são verdadeiramente boas, quer para o secular como para o clérigo, se ordenadas por Deus.
[editar]Os tratados de 1520
[editar]A Nobreza alemã
A disputa havida em Leipzig, em 1519, fez com que Lutero travasse contato com os humanistas, especialmente Melanchthon, Reuchlin e Erasmo de Roterdã, que por sua vez também influenciara ao nobre Franz von Sickingen. Von Sickingen e Silvestre de Schauenbur queriam manter Lutero sob sua proteção, convidando-o para seus castelos na eventualidade de não ser-lhe seguro permanecer na Saxônia, em virtude da proscrição papal.
Sob essas circunstâncias de crise, e confrontando aos nobres alemães, Lutero escreveu "À Nobreza Cristã da Nação Alemã" (agosto de 1520), onde recomendava ao laicado, como um sacerdote espiritual, que fizesse a reforma requerida por Deus, mas abandonada pelo Papa e pelo clero. Pela primeira vez Lutero referiu-se ao Papa como o Anticristo16 .
As reformas que Lutero propunha não se referiam apenas a questões doutrinárias, mas também aos abusos eclesiásticos:
a diminuição do número de cardeais e outras exigências da corte papal;
a abolição das rendas do Papa;
o reconhecimento do governo secular;
a renúncia da exigência papal pelo poder temporal;
a abolição dos Interditos e abusos relacionados com a excomunhão;
a abolição das peregrinações nocivas;
a eliminação dos excessivos dias santos;
a supressão dos conventos para monjas, da mendicidade e da suntuosidade; a reforma das universidades;
a ab-rogação do celibato do clero;
e, finalmente, uma reforma geral na moralidade pública.
Muitas destas propostas refletiam os interesses da nobreza alemã, revoltada com sua submissão ao Papa e, principalmente, com o fato de terem que enviar riquezas a Roma.
[editar]O cativeiro babilônico
Lutero gerou muitas polêmicas doutrinárias com seu "Prelúdio no Cativeiro Babilônico da Igreja", em especial no que diz respeito aos sacramentos.
Eucaristia - apoiava que fosse devolvido o "cálice" ao laicado; na chamada questão do dogma da transubstanciação, afirmava que era real a presença do corpo e do sangue do Cristo na eucaristia, mas refutava o ensinamento de que a eucaristia era o sacrifício oferecido por Deus.
Batismo - ensinava que trazia a justificação apenas se combinado com a fé salvadora em o receber; de fato, mantinha o princípio da salvação inclusive para aqueles que mais tarde se convertessem.
Penitência - afirmou que sua essência consiste na palavra de promessa de desculpas recebidas com fé.
Para ele, apenas estes três sacramentos podiam assim ser considerados, pois sua instituição era divina e a promessa da salvação de Deus estava conexa a eles. Contudo, em sentido estrito, apenas o batismo e a eucaristia seriam verdadeiros sacramentos, pois apenas eles tinham o "sinal visível da instituição divina": a água no batismo e o pão e vinho da eucaristia. Lutero negou, em seu documento, que a confirmação (Crisma), o matrimônio, a ordenação sacerdotal e a extrema-unção fossem sacramentos.
[editar]Liberdade de um Cristão
Da mesma forma, o completo desenvolvimento da doutrina de Lutero sobre a salvação e a vida cristã foi exposto em "A Liberdade de um Cristão" (publicado em 20 de novembro de 1520, onde exigia uma completa união com Cristo mediante a palavra através da fé, e a inteira liberdade do cristão como sacerdote e rei sobre todas as coisas exteriores, e um perfeito amor ao próximo).
As duas teses que Lutero desenvolve nesse tratado são aparentemente contraditórias, mas, em verdade, são complementares:
"O cristão é um senhor libérrimo sobre tudo, a ninguém sujeito";
"O cristão é um servo oficiosíssimo de tudo, a todos sujeito".
A primeira tese é válida "na fé"; a segunda, "no amor".
[editar]A excomunhão
A 15 de junho de 1520, o Papa advertiu Lutero, com a bula "Exsurge Domine", onde o ameaçava com a excomunhão, a menos que, num prazo de setenta dias, repudiasse 41 pontos de sua doutrina, destacados pela Igreja..
Em outubro de 1520, Lutero enviou seu escrito "A Liberdade de um Cristão" ao Papa, acrescentando a frase significativa:
"Eu não me submeto a leis ao interpretar a palavra de Deus".
Enquanto isso, um rumor chegara de que Johan Ech saíra de Meissem com uma proibição papal, enquanto este se pronunciara realmente a 21 de setembro. O último esforço de paz de Lutero foi seguido, em 12 de dezembro, da queima da bula, que já tinha expirado há 120 dias, e o decreto papa de Wittenberg, defendendo-se com seus "Warum des Papstes und seiner Jünger Bücher verbrannt sind" e "Assertio omnium articulorum". O Papa Leão X excomungou Lutero a 3 de janeiro de 1521, na bula "Decet Romanum Pontificem".
A execução da proibição, com efeito, foi evitada pela relação do Papa com Frederico III da Saxônia, e pelo novo imperador, Carlos I de Espanha (Carlos V de Habsburgo), que julgou inoportuno apoiar as medidas contra Lutero, diante de sua posição face à Dieta.
Castelo Wartburg em Eisenach.
[editar]A Dieta de Worms
Ver artigo principal: Dieta de Worms
O Imperador Carlos V inaugurou a Dieta real a 22 de janeiro de 1521. Lutero foi chamado a renunciar ou confirmar seus ditos e foi-lhe outorgado um salvo-conduto para garantir-lhe o seguro deslocamento.
A 16 de abril, Lutero apresentou-se diante da Dieta. Johann Eck, assistente do Arcebispo de Trier, mostrou a Lutero uma mesa cheia de cópias de seus escritos. Perguntou-lhe, então, se os livros eram seus e se ele acreditava naquilo que as obras diziam. Lutero pediu um tempo para pensar em sua resposta, o que lhe foi concedido. Este, então, isolou-se em oração e depois consultou seus aliados e amigos, apresentando-se à Dieta no dia seguinte. Quando a Dieta veio a tratar do assunto, o conselheiro Eck pediu a Lutero que respondesse explicitamente à seguinte questão:
"Lutero, repeles seus livros e os erros que eles contêm?"
Lutero, então, respondeu:
"Que se me convençam mediante testemunho das Escrituras e claros argumentos da razão - porque não acredito nem no Papa nem nos concílios já que está provado amiúde que estão errados, contradizendo-se a si mesmos - pelos textos da Sagrada Escritura que citei, estou submetido a minha consciência e unido à palavra de Deus. Por isto, não posso nem quero retratar-me de nada, porque fazer algo contra a consciência não é seguro nem saudável."
De acordo com a tradição, Lutero, então, proferiu as seguintes palavras:
"Não posso fazer outra coisa, esta é a minha posição. Que Deus me ajude!17
Nos dias seguintes, seguiram-se muitas conferências privadas para determinar qual o destino de Lutero. Antes que a decisão fosse tomada, Lutero abandonou Worms. Durante seu regresso a Wittenberg, desapareceu.
O Imperador redigiu o Édito de Worms a 25 de maio de 1521, declarando Martinho Lutero fugitivo e herege, e proscrevendo suas obras.
[editar]Processo Romano
Martinho Lutero e o Cardeal Caetano, em 1557
Em Junho de 1518, foi aberto o processo contra Lutero, com base na publicação das suas 95 Teses. Alegava-se, com o exame do processo, que ele incorria em heresia. Nas aulas que ministrava na Universidade de Wittenberg, espiões registravam seus comentários negativos sobre a excomunhão. Depois disso, em agosto de 1518, o processo foi alterado para heresia notória. Lutero foi convidado a ir a Roma, onde teria que desmentir sua doutrina.
Lutero recusou-se a fazê-lo, alegando razões de saúde; e pretendeu uma audiência em território alemão. O seu pedido baseava-se no argumento (Gravamina) da Nação Alemã. Seu pedido foi aceito, ele foi convidado para uma audiência com o cardeal Caetano de Vio (Tomás Caetano), durante a reunião das cortes (Reichstag) imperiais de Augsburg. Entre 12 e 14 de outubro de 1518, Lutero falou a Caetano. Este pediu-lhe que revogasse sua doutrina. Lutero recusou-se a fazê-lo.
Do lado romano, o caso pareceu terminado. Por causa da morte de Imperador Maximiliano I (janeiro de 1519), houve uma pausa de dois anos no andamento do processo. O Imperador tinha decidido que o seu sucessor seria Carlos (futuro Carlos V). Por causa das pertenças de Carlos em Itália, o papa renascentista Leão X receava o cerco do Estado da Igreja e procurava evitar que os príncipes-eleitores alemães (Kurfürsten) renunciassem a Carlos.
O papel de protetor de Lutero assumido por Frederico, o sábio, levou a que Roma pedisse que Karl von Miltiz intercedesse junto ao príncipe por uma solução razoável. Após a escolha de Carlos V como imperador (26 de junho de 1519), o processo de Lutero voltaria a ser alvo de preocupações e trabalhos.
O selo de Lutero.
Em junho de 1520, reapareceu a ameaça no escrito "Exsurge Domini" e, em janeiro de 1521, a bula "Decet Romanum Pontificem" excomungou Lutero. Seguiu-se, então, a ameaça oficial do imperador (Reichsacht).
Notável é, no entanto, que Lutero foi, mais uma vez, recebido em audiência, o que também deixou claras as diferenças entre o papado e o império. Carlos foi o último rei (após uma reconciliação) a ser coroado imperador pelo papa. Nos dias 17 e 18 de abril de 1521 Lutero foi ouvido na Dieta de Worms (conferência governativa) e, após ter negado a revogação da sua doutrina, foi publicado o Édito de Worms, banindo Lutero.
[editar]Exílio no Castelo de Wartburg
O seqüestro de Lutero durante a sua viagem de regresso da Dieta de Worms foi arranjado. Frederico, o sábio ordenou que Lutero fosse capturado por um grupo de homens mascarados a cavalo, que o levaram para o Castelo de Wartburg, em Eisenach, onde ele permaneceu por cerca de um ano. Deixou crescer a barba e tomou as vestes de um cavaleiro, assumindo o pseudônimo de Jörg. Durante esse período de retiro forçado, Lutero trabalhou na sua célebre tradução da Bíblia para o alemão.
Martinho Lutero pregando no Castelo Wartburg, quadro de Hugo Vogel.
Com o início da estadia de Lutero em Wartburg, começou um período muito construtivo de sua carreira como reformista. Em seu "Deserto" ou "Patmos" (como ele mesmo chamava, em suas cartas) de Wartburg, começou a tradução da Bíblia, da qual foi impresso o Novo Testamento, em setembro de 1522.
Em Wartburg, ele produziu outros escritos, preparou a primeira parte de seu Guia para Párocos e "Von der Beichte" (Sobre a Confissão), em que nega a obrigatoriedade da confissão, e admite como saudável a confissão privada voluntária. Também escreveu contra o Arcebispo Albrecht, a quem obrigou, com isso, a desistir de retomar a venda das indulgências. Em seus ataques a Jacobus Latomus, avançou em sua visão sobre a relação entre a graça e a lei, assim como sobre a natureza revelada pelo Cristo, distinguindo o objetivo da graça de Deus para o pecador que, por acreditar, é justificado por Deus devido à justiça de Cristo, pois a graça salvadora reside dentro do homem pecador. Ainda mostrou que o "princípio da justificação" é insuficiente, ante a persistência do pecado depois do batismo - pela inerência do pecado em cada boa obra.
Lutero, amiúde, escrevia cartas a seus amigos e aliados, respondendo-lhes ou perguntando-lhes por seus pontos de vista e respondendo-lhes aos pedidos de conselhos. Por exemplo, Felipe Melanchthon lhe escreveu perguntando como responder à acusação de que os reformistas renegavam a peregrinação e outras formas tradicionais de piedade. Lutero respondeu-lhe em 1 de agosto de 1521:
"Se és um pregador da misericórdia, não pregues uma misericórdia imaginária, mas sim uma verdadeira. Se a misericórdia é verdadeira, deve penitenciar ao pecado verdadeiro, não imaginário. Deus não salva apenas aqueles que são pecadores imaginários. Conheça o pecador, e veja se os seus pecados são fortes, mas deixai que tua confiança em Cristo seja ainda mais forte, e que se alegre em Cristo que é o vencedor sobre o pecado, a morte e o mundo. Cometeremos pecados enquanto estivermos aqui, porque nesta vida não há um só lugar onde resida a justiça. Nós todos, sem embargo, disse Pedro (2ª Pedro 3:13), estamos buscando mais além um novo céu e uma nova terra onde a justiça reinará".
Seu quarto no castelo de Wartburg, em Eisenach.
Enquanto isso, alguns sacerdotes saxônicos haviam renunciado ao voto de castidade, ao mesmo tempo em que outros tantos atacavam os votos monásticos. Lutero, em seu De votis monasticis (Sobre os votos monásticos), aconselhava-os a ter mais cautela, aceitando, no fundo, que os votos eram geralmente tomados "com a intenção da salvação ou à busca de justificação". Com a aprovação de Lutero em seu "De abroganda missa privata (Sobre a abrogação da missa privada), mas contra a firme oposição de seu prior, os agostinianos de Wittenberg realizaram a troca das formas de adoração e terminaram com as missas. Sua violência e intolerância certamente desagradaram Lutero que, em princípios de dezembro, passou alguns dias entre eles. Ao retornar para Wartburg, escreveu "Eine treue Vermahnung … vor Aufruhr und Empörung" (Uma sincera admoestação por Martinho Lutero a todos os cristãos para que se resguardem da insurreição e rebelião). Apesar disso, em Wittengerg, Carlstadt e o ex-agostiniano Gabriel Zwilling reclamavam a abolição da missa privada e da comunhão em duas espécies, assim como a eliminação das imagens nas igrejas e a ab-rogação do celibato.
[editar]Regresso a Wittenberg e os Sermões Invocavit
No final do ano de 1521, os anabatistas de Zwickau se entregam à anarquia. Contrário a tais concepções radicais e temendo seus resultados, Lutero regressou em segredo a Wittenberg, em 6 de março de 1522. Durante oito dias, a partir de 9 de março (domingo de Invocavit) e concluindo no domingo seguinte, Lutero pregou outros tantos sermões que tornaram-se conhecidos como os "Sermões de Invocavit".
Nessas pregações, Lutero aconselhou uma reforma cuidadosa, que leve em consideração a consciência daqueles que ainda não estivessem persuadidos a acolher a Reforma. A consagração do pão foi restaurada por um tempo e o cálice sagrado foi ministrado somente àqueles do laicado que o desejaram. O cânon das missas, devido ao seu caráter imolatório, foi suprimido. Devido ao sacramento da confissão ter sido abolido, verificou-se a necessidade que muitas pessoas ainda tinham de confessar-se em busca do perdão. Esta nova forma de serviço foi dada a Lutero em "Formula missæ et communionis" (Fórmula da missa e Comunhão), de 1523. Em 1524 surgiu o primeiro hinário de Wittenberg, com quatro hinos.
Como aquela parte da Saxônia era governada pelo Duque Jorge, que proibira seus escritos, Lutero declarou que a autoridade civil não podia promulgar leis para a alma. Fez isso em sua obra: "Über die weltliche Gewalt, wie weit man ihr Gehorsam schuldig sei" (Autoridade Temporal: em que medida deve ser obedecida).
[editar]Matrimônio e família
Catarina von Bora, esposa de Lutero (retrato feito por Lucas Cranach o Velho - 1526).
Em abril de 1523, Lutero ajudou 12 freiras a escaparem do cativeiro no Convento de Nimbschen. Entre essas freiras encontrava-se Catarina von Bora, filha de nobre família, com quem veio a se casar, em 13 de junho de 1525. Desta união nasceram seis filhos: Johannes, Elisabeth, Magdalena, Martin, Paul e Margaretha. Dos seis filhos, Margaretha foi a única que manteve a linhagem até os dias de hoje. Um descendente ilustre da família Lutero é o ex-presidente alemão Paul von Hindenburg.
O casamento de Lutero com a ex-freira cisterciense incentivou o casamento de outros padres e freiras que haviam adotado a Reforma. Foi um rompimento definitivo com a Igreja Romana.
[editar]Anti-semitismo
Texto anti-semita de Martinho Lutero: Sobre os judeus e suas mentiras (1543)
Martinho Lutero foi anti-semita:18 19 20
"A Alemanha deve ficar livre de judeus, aos quais após serem expulsos, devem ser despojados de todo dinheiro e jóias, prata e ouro, e que fossem incendiadas suas sinagogas e escolas, suas casas derrubadas e destruídas (…), postos sob um telheiro ou estábulo como os ciganos (…), na miséria e no cativeiro assim que estes vermes venenosos se lamentassem de nós e se queixassem incessantemente a Deus". – "Sobre os judeus e suas mentiras" de Martinho Lutero.21 22 23 24
O historiador Robert Michael escreve que Lutero estava preocupado com a questão judaica toda a sua vida, apesar de dedicar apenas uma pequena parte de seu trabalho para ela.25 26 27 Seus principais trabalhos sobre os judeus são Von den Juden und Ihren lügen ("Sobre os judeus e suas mentiras"), e Vom Schem Hamphoras und vom Geschlecht Christi ("Em Nome da Santa linhagem de Cristo") - reimpressas cinco vezes dentro de sua vida - ambas escritas em 1543, três anos antes de sua morte.27 Nesses trabalhos Lutero afirmou que os judeus já não eram o povo eleito, mas o "povo do diabo".27 A sinagoga era como "uma prostituta incorrigível e uma devassa maléfica" e os judeus estavam "cheios das fezes do demónio,... nas quais se rebolam como porcos"26 Lutero aconselhou as pessoas à incendiarem às sinagogas, destruindo os livros judaicos, proibir os rabinos de pregar, e apreender os bens e dinheiro dos Judeus e também expulsá-los ou fazê-los trabalhar forçosamente.24 Lutero também parecia aconselhar seus assassinatos,28 escrevendo "É nossa a culpa em não matar eles."29
A campanha contra os judeus de Lutero foi bem sucedida na Saxónia, Brandenburg, e Silésia. Josel de Rosheim (1480-1554), que tentou ajudar os judeus na Saxónia, escreveu em seu livro de memórias a situação de intolerância foi causada por "(…) esse sacerdote cujo nome é Martinho Lutero - (…) seu corpo e alma vinculada até no inferno!! - que escreveu e publicou muitos livros heréticos no qual disse que quem ajudasse judeus seriam condenados à perdição."30 Josel teria pedido a cidade de Estrasburgo para proibir a venda das obras antijudaicas de Lutero; porém seu pedido foi-lhe negado quando um pastor luterano de Hochfelden argumentou em um sermão que os seus paroquianos deviam assassinar judeus. O anti-semitismo de Lutero persistiu após a sua morte, ao longo de todo o ano 1580, motins expulsaram judeus de vários estados luteranos alemães.27 31
A opinião predominante32 entre os historiadores é que a sua retórica antijudaica contribuiu significativamente para o desenvolvimento do anti-semitismo na Alemanha,33 34 35 36 37 e na década de 1930 e 1940 auxiliou na fundamentação do ideal do nazismo de ataques a judeus.38 O próprio Adolf Hitler em sua autobiografia Mein Kampf considerou Lutero uma das três maiores figuras da Alemanha, juntamente com Frederico, o Grande, e Richard Wagner.39 Em 5 de outubro de 1933, o Pastor Wilhelm Rehm de Reutlingen, declarou publicamente, que "Hitler não teria sido possível, sem Martinho Lutero".40 Julius Streicher, o editor do jornal Nazista Der Stürmer, argumentou durante sua defesa no julgamento de Nuremberg "que nunca havia dito nada sobre os judeus que Martinho Lutero não tivesse dito 400 anos antes".41 Em novembro de 1933, uma manifestação protestante que reuniu um recorde de 20.000 pessoas, aprovou três resoluções:42
Adolf Hitler é a conclusão da Reforma;42
Judeus Batizados devem ser retirados da Igreja;42
O Antigo Testamento deve ser excluído da Sagrada Escritura.42
Diversos historiadores (entre os quais se destacam William L. Shirer e Michael H. Hart43 ) sugerem que a influência de Lutero tenha auxiliado a aceitação do nazismo na Alemanha pelos protestantes no século XX. Shirer fez a seguinte observação em Ascensão e queda do Terceiro Reich:
"É difícil compreender a conduta da maioria dos protestantes nos primeiros anos do nazismo, salvo se estivermos prevenidos de dois fatos: sua história e a influência de Martinho Lutero (para evitar qualquer confusão, devo explicar aqui que o autor é protestante). O grande fundador do protestantismo não foi só anti-semita apaixonado como feroz defensor da obediência absoluta à autoridade política. Desejava a Alemanha livre de judeus (…) – conselho que foi literalmente seguido quatro séculos mais tarde por Hitler, Göring e Himmler.22
Por outro lado, especialmente Shirer recebeu críticas por essa sua observação, sendo acusado de não conhecer suficientemente a história alemã e por ter interpretado incorretamente certos acontecimentos ou mesclado suas opiniões pessoais em seu livro.44 Também os cristãos luteranos afirmam que a Igreja Luterana tem esse nome em homenagem ao seu mais famoso líder, porém não acata todos os escritos teológicos de Lutero, principalmente os escritos que atacam os judeus. Desde os anos 1980, alguns órgãos da Igreja Luterana formalmente denunciaram e dissociaram-se dos escritos de Lutero sobre os judeus. Em novembro de 1998, no 60º aniversário de Kristallnacht, a Igreja Luterana da Baviera emitiu uma afirmação: "é imperativo para a Igreja Luterana, que sabe que é endividada ao trabalho e a tradição de Martinho Lutero, de levar a sério também as suas declarações anti-judaicas, reconhece a sua função teológica, e reflete nas suas conseqüências. Temos que nos distanciar de cada [expressão de] antissemitismo na teologia Luterana."45 46 47 48 49
[editar]A guerra dos camponeses
A guerra dos camponeses (1524-1525) foi, de muitas maneiras, uma resposta aos discursos de Lutero e de outros reformadores. Revoltas de camponeses já tinham existido em pequena escala em Flandres (1321-1323), na França (1358), na Inglaterra (1381-1388), durante as guerras hussitas do século XV, e muitas outras até o século XVIII. Mas muitos camponeses julgaram que os ataques verbais de Lutero à Igreja e sua hierarquia significavam que os reformadores iriam igualmente apoiar um ataque armado à hierarquia social. Por causa dos fortes laços entre a nobreza hereditária e os líderes da Igreja que Lutero condenava, isso não seria surpreendente.
Já em 1522, enquanto Lutero estava em Wartburg, seu seguidor Thomas Münzer, comandou massas camponesas contra a nobreza imperial, pois propunha uma sociedade sem diferenças entre ricos e pobres e sem propriedade privada,50 Lutero por sua vez defendia que a existência de "senhores e servos" era vontade divina,50 motivo pelo qual eles romperam.51 Lutero, desde cedo, argumentou com a nobreza e os próprios camponeses sobre uma possível revolta e também sobre Müntzer, classificando-o como um dos "profetas do assassínio" e colocando-o como um dos mentores do movimento camponês. Lutero escreveu a "Terrível História e Juízo de Deus sobre Tomas Müntzer", inaugurando essa linha de pensamento.
Na iminência da revolta (1524), Lutero escreveu a "Carta aos Príncipes da Saxônia sobre o Espírito Revoltoso", mostrando a tirania dos nobres que oprimiam o povo e a loucura dos camponeses em reagir através da força e a confiar em Müntzer como pregador. Houve pouca repercussão sobre esse escrito.
Ainda em 1524, Müntzer mudou-se para a cidade imperial de Mühlhausen, oferecendo-se como pregador. Lutero escreveu a "Carta Aberta aos Burgomestres, Conselho e toda a Comunidade da Cidade de Mühlhausen", com o propósito de alertar sobre as intenções de Müntzer. Também esse escrito não teve repercussão, pois o conselho da cidade se limitou a pedir informações sobre Müntzer na cidade imperial de Weimar.
O principal escrito dos camponeses eram os "Doze Artigos", onde suas reivindicações eram expostas. Neles havia artigos de fundo teológico (direito de ouvir o Evangelho através de pregadores chamados por eles próprios) e artigos que tratavam dos maus tratos (exploração nos impostos, etc.) impostos a eles pelos nobres. Os artigos eram fundamentados com passagens bíblicas e dizia-se que se alguém pudesse provar pelas Escrituras que aquelas reivindicações eram injustas, eles as abandonariam. Entre aqueles que se consideravam dignos de fazer tal coisa estava o nome de Martinho Lutero.
De fato, Lutero escreveu sobre os "Doze artigos" em seu livro "Exortação à Paz: Resposta aos Doze artigos do Campesinato da Suábia", de 1525. Nele, Lutero ataca os príncipes e senhores por cometerem injustiças contra os camponeses e ataca os camponeses pela rebelião e desrespeito à autoridade.
Também esse escrito não teve repercussão e, durante uma viagem pela região da Turíngia, Lutero pôde testemunhar as revoltas camponesas, o que o motivou a escrever o "Adendo: Contra as Hordas Salteadoras e Assassinas dos Camponeses", onde disse: "Contras as hordas de camponeses (…), quem puder que bata, mate ou fira, secreta ou abertamente, relembrando que não há nada mais peçonhento, prejudicial e demoníaco que um rebelde".50 Tratava-se de um apêndice de "Exortação à Paz …", mas que, rapidamente, tornou-se um livro separado. O Adendo foi publicado quando a revolta camponesa já estava no final e os príncipes cometiam atrocidades contra os camponeses derrotados, de modo que o escrito causou grande revolta da opinião pública contra Lutero. Nele, Lutero encorajava os príncipes a castigarem os camponeses até mesmo com a morte.
Essa repercussão negativa obrigou Lutero a pregar um sermão no dia de pentecostes, em 1525, que se tornou o livro "Posicionamento do Dr. Martinho Lutero Sobre o Livrinho Contra os Camponeses Assaltantes e Assassinos", onde o reformador contesta os críticos e reafirma sua posição anterior.
Como ainda havia repercussão negativa, Lutero novamente se posicionou sobre a questão no seu "Carta Aberta a Respeito do Rigoroso Livrinho Contra os Camponeses", onde lamenta e exorta contra a crueldade que estava sendo praticada pelos príncipes, mas reafirma sua posição anterior.
Por fim, a pedido de um amigo, o cavaleiro Assa von Kram, Lutero redigiu "Acerca da Questão, Se Também Militares Ocupam uma Função Bem-Aventurada", em 1526, com o propósito de esclarecer questões sobre consciência do cristão em caso de guerra e sua função como militar.
[editar]A discordância com João Calvino
João Calvino (Retrato de Calvino jovem, da coleção da Biblioteca de Genebra)
No movimento reformista (também chamado de Reforma), Lutero não concordou com o "estilo" de reforma de João Calvino. Martinho Lutero queria reformar a Igreja Católica,52 enquanto João Calvino, acreditava que a Igreja estava tão degenerada, que não havia como reformá-la. Calvino se propunha a organizar uma nova Igreja que, na sua doutrina (e também em alguns costumes), seria idêntica à Igreja Primitiva. Já Lutero decidiu reformá-la, mas afastou-se desse objetivo, fundando, então, o Protestantismo, que não seguia tradições, mas apenas a doutrina registrada na Bíblia, e cujos usos e costumes não ficariam presos a convenções ou épocas. A doutrina luterana está explicitada no "Livro de Concórdia", e não muda, embora os costumes e formas variem de acordo com a localidade e a época.
[editar]Falecimento
O ex-monge agostiniano Martinho Lutero teve morte natural, embora não haja um consenso entre os seus biógrafos acerca da sua causa de morte. O historiador Frantz Funck-Brentano, por exemplo, escreveu em sua obra "Martim Lutero":
"Os dois médicos, que o tinham tratado nos últimos momentos, não puderam chegar a um acordo sobre a causa de sua morte, opinando um por um ataque de apoplexia, outro por uma angina pulmonar."53
A propósito, em 1521, por ocasião da Dieta de Worms (uma espécie de audiência imperial), foi publicado pelo Imperador Carlos V o Edito de Worms, pelo qual qualquer pessoa, ao menos teoricamente, estaria livre para matar Lutero sem correr o risco de sofrer qualquer sanção penal, já que, pelo referido Edito do Imperador, Lutero foi banido do Império como um fora-da-lei. Por receio de que algo de mal pudesse acontecer a Lutero durante viagem de regresso de Worms, Frederico III (ou Frederico, o Sábio), Príncipe-Eleitor da Saxônia, ordenou que Lutero fosse capturado e levado para o Castelo de Wartburg, onde estaria a salvo.
Provavelmente, foi por causa desse risco de morte que Lutero passou a correr que seu amigo disse que "tentaram matá-lo". Encontra-se sepultado na Igreja de Wittenberg em Wittenberg.54
[editar]Obras importantes
As 95 Teses, de Lutero
Foi o autor de uma das primeiras traduções da Bíblia para alemão, algo que não era permitido até então sem especial autorização eclesiástica. Lutero, contudo, não foi o primeiro tradutor da Bíblia para alemão. Já havia várias traduções mais antigas. A tradução de Lutero, no entanto, suplantou as anteriores porque foi uma forma unificada do Hochdeutsch (dialetos alemães da região central e sul) e foi amplamente divulgada em decorrência da sua difusão por meio da imprensa, desenvolvida por Gutenberg, em 1453.
Lutero introduziu a palavra alleyn 55 , 56 que não aparece no texto grego original57 no capítulo 3:28 da Epístola aos Romanos. O que gerou controvérsia. Lutero justificou a manutenção do advérbio como sendo uma necessidade idiomática do alemão como por ser a intenção de Paulo58 .
O latim, língua do extinto Império Romano, permanecia a lingua franca européia, imediatamente conotada com o passado romano unificado, sendo também a língua da Vulgata traduzida por São Jerônimo no século V, tal como tinham sido transmitidos às províncias do Império. Por mais longínquas que fossem, nos menos de cem anos que separam a oficialização da religião cristã pelo Imperador Romano Teodósio I em 380 d.C. e a deposição do último imperador de Roma pelo Germânico Odoacro, em 476 d.C. (data avançada por Edward Gibbon e convencionalmente aceita como ano da queda do Império Romano do Ocidente), toda a região do antigo Império, ao longo dos seguintes 500 anos, e de forma mais ou menos homogênea, se cristianizou. O fim da perseguição à religião cristã pelo império romano se deu em 313 d.C. (Ver: Édito de Milão, Concílio de Niceia, Constantino I, A história do declínio e queda do império romano, Jerónimo de Estridão).
No entanto, o domínio do latim era, no século XVI, no fim da Idade Média (terminada oficialmente em 1453, com a tomada de Constantinopla pelos Otomanos) e princípio da chamada Idade Moderna, apenas o privilégio de uma percentagem ínfima de população instruída, entre os quais os elementos da própria Igreja. A tradução de Lutero para o alemão foi simultaneamente um ato de desobediência e um pilar da sistematização do que viria a ser a língua alemã, até aí vista como uma língua inferior, dos servos e ignorantes. É preciso adicionar que Lutero não se opunha ao latim, e chegou mesmo a publicar uma edição revisada da tradução latina da Bíblia (Vulgata). Lutero escrevia tanto em latim como em alemão. A tradução da Bíblia para o alemão não significou, portanto, rejeição do latim como língua acadêmica.
Foi também autor da polêmica obra "Sobre os judeus e suas mentiras" (Von den Juden und ihren Lügen). Pouco conhecida, mas muito apreciada pelo próprio Lutero, foi sua resposta a "Diatribe" de Erasmo de Roterdã intitulada De servo arbitrio (Título da publicação em português: Da vontade cativa).
Martinho Lutero defendia o princípio da mortalidade da alma contrastando com a crença de João Calvino, que chamou à crença de Lutero "sono da alma".
[editar]Reabilitação de Lutero?
Segundo a Revista editada em conjunto pela Igreja Evangélica Metodista Portuguesa e a Igreja Evangélica Presbiteriana de Portugal, Portugal Evangélico, em sua edição nº 93259 , de 2008, o Papa Bento XVI, poderia vir a reabilitar Lutero. Segundo o texto, "Vozes autorizadas do Vaticano adiantavam que o Papa reabilitaria Martinho Lutero argumentando que nunca teria sido sua intenção dividir a Igreja mas sim lutar contra os abusos e práticas de corrupção da mesma". E complementa dizendo que "O Cardeal Walter Kasper, Presidente do Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos, antecipava que estas declarações dariam nova coragem ao diálogo ecuménico e contradiriam, até certo ponto, as afirmações feitas em Julho do ano anterior denegrindo a fé, a ortodoxa e protestante, ao não considerar estes dois ramos do cristianismo como verdadeiras Igrejas". Porém, nesse mesmo ano, o site Agência Ecclesia, agência de notícias da Igreja Católica em Portugal, desmentiu essa notícia citando uma declaração do diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé, padre Federico Lombardi dada ao jornal britânico Financial Times.60 Segundo o religioso, essa afirmação “não tem nenhum fundamento” e que o termo “reabilitação” nunca seria o correto neste caso. Depois dessas notícias não houve mais informações até o momento sobre uma possível reabilitação de Lutero pela Igreja Católica.
[editar]Declaração conjunta sobre a doutrina da Justificação pela Fé
Em 31 de outubro de 1999, foi assinada uma Declaração Conjunta Sobre a Doutrina da Justificação pela Fé61 , redigida e aprovada pela Federação Luterana Mundial e pela Igreja Católica Apostólica Romana. O preâmbulo do documento diz que a declaração "quer mostrar que, com base no diálogo, as Igrejas luteranas signatárias e a Igreja católica romana estão agora em condições de articular uma compreensão comum de nossa justificação pela graça de Deus na fé em Cristo. Esta Declaração Comum (DC) não contém tudo o que é ensinado sobre justificação em cada uma das Igrejas, mas abarca um consenso em verdades básicas da doutrina da justificação e mostra que os desdobramentos distintos ainda existentes não constituem mais motivo de condenações doutrinais". A declaração pode ser resumida neste trecho: "Confessamos juntos que o pecador é justificado pela fé na acção salvífica de Deus em Cristo; essa salvação lhe é presenteada pelo Espírito Santo no baptismo como fundamento de toda a sua vida cristã. Na fé justificadora o ser humano confia na promessa graciosa de Deus; nessa fé estão compreendidos a esperança em Deus e o amor a Ele".
As 95 Teses de Martinho Luteropor
Martinho Lutero
Em 31 de Outubro de 1517, Martinho Lutero afixou na porta da capela de Wittemberg 95 teses que gostaria de discutir com os teólogos católicos, as quais versavam principalmente sobre penitência, indulgências e a salvação pela fé. O evento marca o início da Reforma Protestante, de onde posteriormente veio a Igreja Presbiteriana, e representa um marco e um ponto de partida para a recuperação das sãs doutrinas.
Movido pelo amor e pelo empenho em prol do esclarecimento da verdade discutir-se-á em Wittemberg, sob a presidência do Rev. padre Martinho Lutero, o que segue. Aqueles que não puderem estar presentes para tratarem o assunto verbalmente conosco, o poderão fazer por escrito.
Em nome de nosso Senhor Jesus Cristo. Amém.
1ª Tese
|
Dizendo nosso Senhor e Mestre Jesus Cristo: Arrependei-vos...., certamente quer que toda a vida dos seus crentes na terra seja contínuo arrependimento.
|
2ª Tese
|
E esta expressão não pode e não deve ser interpretada como referindo-se ao sacramento da penitência, isto é, à confissão e satisfação, a cargo do ofício dos sacerdotes.
|
3ª Tese
|
Todavia não quer que apenas se entenda o arrependimento interno; o arrependimento interno nem mesmo é arrependimento quando não produz toda sorte de modificações da carne.
|
4ª Tese
|
Assim sendo, o arrependimento e o pesar, isto é, a verdadeira penitência, perdura enquanto o homem se desagradar de si mesmo, a saber, até a entrada desta para a vida eterna.
|
5ª Tese |
O papa não quer e não pode dispensar outras penas, além das que impôs ao seu alvitre ou em acordo com os cânones, que são estatutos papais.
|
6ª Tese
|
O papa não pode perdoar divida senão declarar e confirmar aquilo que Já foi perdoado por Deus; ou então faz nos casos que lhe foram reservados. Nestes casos, se desprezados, a dívida deixaria de ser em absoluto anulada ou perdoada.
|
7ª Tese
|
Deus a ninguém perdoa a dívida sem que ao mesmo tempo o subordine, em sincera humildade, ao sacerdote, seu vigário.
|
8ª Tese
|
Canones poenitendiales, que não as ordenanças de prescrição da maneira em que se deve confessar e expiar, apenas aio Impostas aos vivos, e, de acordo com as mesmas ordenanças, não dizem respeito aos moribundos.
|
9ª Tese
|
Eis porque o Espírito Santo nos faz bem mediante o papa, excluído este de todos os seus decretos ou direitos o artigo da morte e da necessidade suprema
|
10ª Tese
|
Procedem desajuizadamente e mal os sacerdotes que reservam e impõem aos moribundos poenitentias canonicas ou penitências para o purgatório a fim de ali serem cumpridas.
|
11ª Tese
|
Este joio, que é o de se transformar a penitência e satisfação, Previstas pelos cânones ou estatutos, em penitência ou penas do purgatório, foi semeado quando os bispos se achavam dormindo.
|
12ª Tese
|
Outrora canonicae poenae, ou sejam penitência e satisfação por pecadores cometidos eram impostos, não depois, mas antes da absolvição, com a finalidade de provar a sinceridade do arrependimento e do pesar.
|
13ª Tese
|
Os moribundos tudo satisfazem com a sua morte e estão mortos para o direito canônico, sendo, portanto, dispensados, com justiça, de sua imposição.
|
14ª Tese
|
Piedade ou amor Imperfeitos da parte daquele que se acha às portas da morte necessariamente resultam em grande temor; logo, quanto menor o amor, tanto maior o temor.
|
15ª Tese
|
Este temor e espanto em si tão só, sem falar de outras cousas, bastam para causar o tormento e o horror do purgatório, pois que se avizinham da angústia do desespero.
|
16ª Tese
|
Inferno, purgatório e céu parecem ser tão diferentes quanto o são um do outro o desespero completo, incompleto ou quase desespero e certeza.
|
17ª Tese
|
Parece que assim como no purgatório diminuem a angústia e o espanto das almas, nelas também deve crescer e aumentar o amor.
|
18ª Tese
|
Bem assim parece não ter sido provado, nem por boas ações e nem pela Escritura, que as almas no purgatório se encontram fora da possibilidade do mérito ou do crescimento no amor.
|
19ª Tese
|
Ainda parece não ter sido provado que todas as almas do purgatório tenham certeza de sua salvação e não receiem por ela, não obstante nós termos absoluta certeza disto.
|
20ª Tese
|
Por isso o papa não quer dizer e nem compreende com as palavras “perdão plenário de todas as penas” que todo o tormento é perdoado, mas as penas por ele impostas.
|
21ª Tese
|
Eis porque erram os apregoadores de indulgências ao afirmarem ser o homem perdoado de todas as penas e salvo mediante a indulgência do papa.
|
22ª Tese
|
Pensa com efeito, o papa nenhuma pena dispensa às almas no purgatório das que segundo os cânones da Igreja deviam ter expiado e pago na presente vida.
|
23ª Tese
|
Verdade é que se houver qualquer perdão plenário das penas, este apenas será dado aos mais perfeitos, que são muito poucos.
|
24ª Tese
|
Assim sendo, a maioria do povo é ludibriada com as pomposas promessas do indistinto perdão, impressionando-se o homem singelo com as penas pagas.
|
25ª Tese
|
Exatamente o mesmo poder geral, que o papa tem sobre o purgatório, qualquer bispo e cura d'almas o tem no seu bispado e na sua paróquia, quer de modo especial e quer para com os seus em particular.
|
26ª Tese
|
O papa faz muito bem em não conceder às almas o perdão em virtude do poder das chaves (ao qual não possui), mas pela ajuda ou em forma de intercessão.
|
27ª Tese
|
Pregam futilidades humanas quantos alegam que no momento em que a moeda soa ao cair na caixa a alma se vai do purgatório.
|
28ª Tese
|
Certo é que no momento em que a moeda soa na caixa vêm o lucro e o amor ao dinheiro cresce e aumenta; a ajuda, porém, ou a intercessão da Igreja tão só correspondem à vontade e ao agrado de Deus.
|
29ª Tese
|
E quem sabe, se todas as almas do purgatório querem ser libertadas, quando há quem diga o que sucedeu com Santo Severino e Pascoal.
|
30ª Tese
|
Ninguém tem certeza da suficiência do seu arrependimento e pesar verdadeiros; muito menos certeza pode ter de haver alcançado pleno perdão dos seus pecados.
|
31ª Tese
|
Tão raro como existe alguém que possui arrependimento e, pesar verdadeiros, tão raro também é aquele que verdadeiramente alcança indulgência, sendo bem poucos os que se encontram.
|
32ª Tese
|
Irão para o diabo juntamente com os seus mestres aqueles que julgam obter certeza de sua salvação mediante breves de indulgência.
|
33ª Tese
|
Há que acautelasse muito e ter cuidado daqueles que dizem: A indulgência do papa é a mais sublime e mais preciosa graça ou dadiva de Deus, pela qual o homem é reconciliado com Deus.
|
34ª Tese
|
Tanto assim que a graça da indulgência apenas se refere à pena satisfatória estipulada por homens.
|
35ª Tese
|
Ensinam de maneira ímpia quantos alegam que aqueles que querem livrar almas do purgatório ou adquirir breves de confissão não necessitam de arrependimento e pesar.
|
36ª Tese
|
Todo e qualquer cristão que se arrepende verdadeiramente dos seus pecados, sente pesar por ter pecado, tem pleno perdão da pena e da dívida, perdão esse que lhe pertence mesmo sem breve de indulgência.
|
37ª Tese
|
Todo e qualquer cristão verdadeiro, vivo ou morto, é participante de todos os bens de Cristo e da Igreja, dádiva de Deus, mesmo sem breve de indulgência.
|
38ª Tese
|
Entretanto se não deve desprezar o perdão e a distribuição por parte do papa. Pois, conforme declarei, o seu perdão constitui uma declaração do perdão divino.
|
39ª Tese
|
É extremamente difícil, mesmo para os mais doutos teólogos, exaltar diante do povo ao mesmo tempo a grande riqueza da indulgência e ao contrário o verdadeiro arrependimento e pesar.
|
40ª Tese
|
O verdadeiro arrependimento e pesar buscam e amam o castigo: mas a profusão da indulgência livra das penas e faz com que se as aborreça, pelo menos quando há oportunidade para isso.
|
41ª Tese
|
É necessário pregar cautelosamente sobre a indulgência papal para que o homem singelo não julgue erroneamente ser a indulgência preferível às demais obras de caridade ou melhor do que elas.
|
42ª Tese
|
Deve-se ensinar aos cristãos, não ser pensamento e opinião do papa que a aquisição de indulgência de alguma maneira possa ser comparada com qualquer obra de caridade.
|
43ª Tese
|
Deve-se ensinar aos cristãos proceder melhor quem dá aos pobres ou empresta aos necessitados do que os que compram indulgências.
|
44ª Tese
|
Ê que pela obra de caridade cresce o amor ao próximo e o homem torna-se mais piedoso; pelas indulgências, porém, não se torna melhor senão mais seguro e livre da pena.
|
45ª Tese
|
Deve-se ensinar aos cristãos que aquele que vê seu próximo padecer necessidade e a despeito disto gasta dinheiro com indulgências, não adquire indulgências do papa. mas provoca a ira de Deus.
|
46ª Tese
|
Deve-se ensinar aos cristãos que, se não tiverem fartura , fiquem com o necessário para a casa e de maneira nenhuma o esbanjem com indulgências.
|
47ª Tese
|
Deve-se ensinar aos cristãos, ser a compra de indulgências livre e não ordenada
|
48ª Tese
|
Deve-se ensinar aos cristãos que, se o papa precisa conceder mais indulgências, mais necessita de uma oração fervorosa do que de dinheiro.
|
49ª Tese
|
Deve-se ensinar aos cristãos, serem muito boas as indulgências do papa enquanto o homem não confiar nelas; mas muito prejudiciais quando, em conseqüência delas, se perde o temor de Deus.
|
50ª Tese
|
Deve-se ensinar aos cristãos que, se o papa tivesse conhecimento da traficância dos apregoadores de indulgências, preferiria ver a catedral de São Pedro ser reduzida a cinzas a ser edificada com a pele, a carne e os ossos de suas ovelhas.
|
51ª Tese
|
Deve-se ensinar aos cristãos que o papa, por dever seu, preferiria distribuir o seu dinheiro aos que em geral são despojados do dinheiro pelos apregoadores de indulgências, vendendo, se necessário fosse, a própria catedral de São Pedro.
|
52º Tese
|
Comete-se injustiça contra a Palavra de Deus quando, no mesmo sermão, se consagra tanto ou mais tempo à indulgência do que à pregação da Palavra do Senhor.
|
53ª Tese
|
São inimigos de Cristo e do papa quantos por causa da prédica de indulgências proíbem a Palavra de Deus nas demais igrejas.
|
54ª Tese
|
Esperar ser salvo mediante breves de indulgência é vaidade e mentira, mesmo se o comissário de indulgências, mesmo se o próprio papa oferecesse sua alma como garantia.
|
55ª Tese
|
A intenção do papa não pode ser outra do que celebrar a indulgência, que é a causa menor, com um sino, uma pompa e uma cerimônia, enquanto o Evangelho, que é o essencial, importa ser anunciado mediante cem sinos, centenas de pompas e solenidades.
|
56ª Tese
|
Os tesouros da Igreja, dos quais o papa tira e distribui as indulgências, não são bastante mencionados e nem suficientemente conhecido na Igreja de Cristo.
|
57ª Tese
|
Que não são bens temporais, é evidente, porquanto muitos pregadores a estes não distribuem com facilidade, antes os ajuntam.
|
58ª Tese
|
Tão pouco são os merecimentos de Cristo e dos santos, porquanto estes sempre são eficientes e, independentemente do papa, operam salvação do homem interior e a cruz, a morte e o inferno para o homem exterior.
|
59ª Tese
|
São Lourenço aos pobres chamava tesouros da Igreja, mas no sentido em que a palavra era usada na sua época.
|
60ª Tese
|
Afirmamos com boa razão, sem temeridade ou leviandade, que estes tesouros são as chaves da Igreja, a ela dado pelo merecimento de Cristo.
|
61ª Tese
|
Evidente é que para o perdão de penas e para a absolvição em determinados casos o poder do papa por si só basta.
|
62ª Tese
|
O verdadeiro tesouro da Igreja é o santíssimo Evangelho da glória e da graça de Deus.
|
63ª Tese
|
Este tesouro, porém, é muito desprezado e odiado, porquanto faz com que os primeiros sejam os últimos.
|
64ª Tese
|
Enquanto isso o tesouro das indulgências é sabiamente o mais apreciado, porquanto faz com que os últimos sejam os primeiros.
|
65ª Tese
|
Por essa razão os tesouros evangélicos outrora foram as redes com que se apanhavam os ricos e abastados.
|
66ª Tese
|
Os tesouros das indulgências, porém, são as redes com que hoje se apanham as riquezas dos homens.
|
67ª Tese
|
As indulgências apregoadas pelos seus vendedores como a mais sublime graça decerto assim são consideradas porque lhes trazem grandes proventos.
|
68ª Tese
|
Nem por isso semelhante indigência não deixa de ser a mais Intima graça comparada com a graça de Deus e a piedade da cruz.
|
69ª Tese
|
Os bispos e os sacerdotes são obrigados a receber os comissários das indulgências apostólicas com toda a reverência-
|
70ª Tese
|
Entretanto têm muito maior dever de conservar abertos olhos e ouvidos, para que estes comissários, em vez de cumprirem as ordens recebidas do papa, não preguem os seus próprios sonhos.
|
71ª Tese
|
Aquele, porém, que se insurgir contra as palavras insolentes e arrogantes dos apregoadores de indulgências, seja abençoado.
|
72ª Tese
|
Quem levanta a sua voz contra a verdade das indulgências papais é excomungado e maldito.
|
73ª Tese
|
Da mesma maneira em que o papa usa de justiça ao fulminar com a excomunhão aos que em prejuízo do comércio de indulgências procedem astuciosamente.
|
74ª Tese
|
Muito mais deseja atingir com o desfavor e a excomunhão àqueles que, sob o pretexto de indulgência, prejudiquem a santa caridade e a verdade pela sua maneira de agir.
|
75ª Tese
|
Considerar as indulgências do papa tão poderosas, a ponto de poderem absolver alguém dos pecados, mesmo que (cousa impossível) tivesse desonrado a mãe de Deus, significa ser demente.
|
78 ª Tese
|
Bem ao contrario, afirmamos que a indulgência do papa nem mesmo o menor pecado venial pode anular o que diz respeito à culpa que constitui.
|
77ª Tese
|
Dizer que mesmo São Pedro, se agora fosse papa, não poderia dispensar maior indulgência, significa blasfemar S. Pedro e o papa.
|
78ª Tese
|
Em contrario dizemos que o atual papa, e todos os que o sucederam, é detentor de muito maior indulgência, isto é, o Evangelho, as virtudes o dom de curar, etc., de acordo com o que diz 1Coríntios 12.
|
79ª Tese
|
Afirmar ter a cruz de indulgências adornada com as armas do papa e colocada na igreja tanto valor como a própria cruz de Cristo, é blasfêmia.
|
80ª Tese
|
Os bispos, padres e teólogos que consentem em semelhante linguagem diante do povo, terão de prestar contas deste procedimento.
|
81ª Tese
|
Semelhante pregação, a enaltecer atrevida e insolentemente a Indulgência, faz com que mesmo a homens doutos é difícil proteger a devida reverência ao papa contra a maledicência e as fortes objeções dos leigos.
|
82 ª Tese
|
Eis um exemplo: Por que o papa não tira duma só vez todas as almas do purgatório, movido por santíssima' caridade e em face da mais premente necessidade das almas, que seria justíssimo motivo para tanto, quando em troca de vil dinheiro para a construção da catedral de S. Pedro, livra um sem número de almas, logo por motivo bastante Insignificante?
|
83ª Tese
|
Outrossim: Por que continuam as exéquias e missas de ano em sufrágio das almas dos defuntos e não se devolve o dinheiro recebido para o mesmo fim ou não se permite os doadores busquem de novo os benefícios ou pretendas oferecidos em favor dos mortos, visto' ser Injusto continuar a rezar pelos já resgatados?
|
84ª Tese
|
Ainda: Que nova piedade de Deus e dó papa é esta, que permite a um ímpio e inimigo resgatar uma alma piedosa e agradável a Deus por amor ao dinheiro e não resgatar esta mesma alma piedosa e querida de sua grande necessidade por livre amor e sem paga?
|
85ª Tese
|
Ainda: Por que os cânones de penitencia, que, de fato, faz muito caducaram e morreram pelo desuso, tornam a ser resgatados mediante dinheiro em forma de indulgência como se continuassem bem vivos e em vigor?
|
86ª Tese
|
Ainda: Por que o papa, cuja fortuna hoje é mais principesca do que a de qualquer Credo, não prefere edificar a catedral de S. Pedro de seu próprio bolso em vez de o fazer com o dinheiro de fiéis pobres?
|
87ª Tese
|
Ainda: Quê ou que parte concede o papa do dinheiro proveniente de indulgências aos que pela penitência completa assiste o direito à indulgência plenária?
|
88ª Tese
|
Afinal: Que maior bem poderia receber a Igreja, se o papa, como Já O faz, cem vezes ao dia, concedesse a cada fiel semelhante dispensa e participação da indulgência a título gratuito.
|
89ª Tese
|
Visto o papa visar mais a salvação das almas do que o dinheiro, por que revoga os breves de indulgência outrora por ele concedidos, aos quais atribuía as mesmas virtudes?
|
90ª Tese
|
Refutar estes argumentos sagazes dos leigos pelo uso da força e não mediante argumentos da lógica, significa entregar a Igreja e o papa a zombaria dos inimigos e desgraçar os cristãos.
|
91ª Tese
|
Se a Indulgência fosse apregoada segundo o espírito e sentido do papa, aqueles receios seriam facilmente desfeitos, nem mesmo teriam surgido.
|
92ª Tese
|
Fora, pois, com todos estes profetas que dizem ao povo de Cristo: Paz! Paz! e não há Paz.
|
93ª Tese
|
Abençoados sejam, porém, todos os profetas que dizem à grei de Cristo: Cruz! Cruz! e não há cruz.
|
94ª Tese
|
Admoestem-se os cristãos a que se empenhem em seguir sua Cabeça Cristo através do padecimento, morte e inferno.
|
95ª Tese
|
E assim esperem mais entrar no Reino dos céus através de muitas tribulações do que facilitados diante de consolações infundadas.
|