Prof. MsC. Sylvio Fausto Gil Filho
(Departamento de Geografia/Universidade Federal do Paraná)
A revisão da religião, como fenômeno que a luz do processo histórico empreendeu o desenvolvimento e superação do homem no plano de suas concepções diante da vida e na organização das sociedades, torna-se perfeitamente justificável.
O que parece-nos razoável diante dos trabalhos sobre o assunto, está sob o prisma de interpretação da realidade religiosa, que em várias épocas e em vários ambientes culturais os diversos pesquisadores do tema anunciaram relações ou mesmo admitiram possíveis conexões entre as diversas religiões reveladas ao mundo.
Não se trata aqui de escrever mais um ensaio de religiões comparadas tentando na medida do possível buscar no método empregado a objetividade e a neutralidade. Desejamos sim, desenvolver as relações entre as religiões sob a base da revelação de Bahá’u’lláh.
O que diagnosticamos no cerne das sociedades humanas é a presença da religião com fenômeno de caráter totalizante.
A opção pôr uma fenomenologia da Religião explica-se pela adaptabilidade do método na não construção de uma argumentação hierarquizante entre os diversos fenômenos possibilitando a busca profunda das realidades.
A Fenomenologia da Religião emprega base teórico-metodológica de HUSSERL (1859-1938), filósofo alemão. Ele afirma que os fenômenos devem ser apreendidos na medida em que são vivenciados pela consciência intuitiva.
A metodologia neste caso não baseia-se exclusivamente no empirismo mas buscaria as essências das quais os fenômenos não seriam apenas meras aparências e sim eles próprios em sua totalidade. Ou seja, a fenomenologia preocupa-se com o ser enquanto ser a revelia ao modo pelo qual se manifesta, buscando assim as essências absolutas de tudo o que existe.
Este fenômeno porém, não pode ser compreendido na escala pura e simples das ciências humanas, embora a utilização de suas concepções sejam significativas. Seria oportuno admitir que toda e qualquer análise que façamos do fenômeno religioso só será devidamente abrangente se também o considerarmos sob os seus próprios padrões de análise. Ou seja, estudar a Religião pôr ela mesma.
Como comenta ELIADE (1970):
...um fenômeno religioso somente se revelará como tal com a condição de ser apreendido dentro da sua própria realidade, isto é, de ser estudado à escala religiosa. Querer delimitar este fenômeno pela fisiologia, pela psicologia, pela sociologia e pela ciência econômica, pela lingüística e pela arte, etc... é traí-lo, é deixar escapar precisamente aquilo que nele existe de único e irredutível, ou seja, o seu caráter sagrado. (Trat. Hist. Rel. p. 17)
O conhecimento do fenômeno da religião torna-se inteligível na medida em que o analisamos no plano do sagrado.
Contudo, o problema da análise não é apenas de escala, mas também os ditames da ciência e do método.
Acreditamos que uma visão holística do conhecimento seja necessária a fim de não corrermos o risco do reducionismo.
Ao propormos a totalidade do fenômeno religioso tentamos demonstrar a
necessidade de rompermos as barreiras da compartimentação da ciência de raízes positivistas.
Quando procuramos uma teoria do fenômeno religioso baseada nos enunciados bahá’ís, nos deparamos com a formação e o conceito de ciência corrente de base materialista. Porque não admite nada além do concreto e objetivo e acredita na neutralidade do método como verdade absoluta.
A crença dos bahá’ís na unidade orgânica da humanidade e no poder catalisador da Fé, não é compatível à produção do conhecimento baseado estritamente nos parâmetros positivistas.
De fato não existe verdades absolutas abarcadas pela égide científica.
A unidade entre ciência e religião se faz necessário. Todavia, o que queremos dizer com esta interação? De nenhum modo podemos condicionar a religião aos limites da ciência ou mesmo aceitar integralmente a objetividade exclusiva pôr parte da ciência.
Lembrando uma conferência de ARBAB (1986):
Uma das pretensões do mundo intelectual em qualquer campo é a de que eles são objetivos. Asseveram os pensadores que unicamente a ciência é objetiva e que encontra a verdade pôr meio de métodos científicos. A religião, porém, é considerada como assunto subjetivo. Esta pretensão gravada na mente da maioria dos intelectuais é cem pôr cento falsa. (Anais 1ª Conf. AEBB p.08).
A tese da objetividade têm como base no método científico ao qual se atribui a supremacia e a unidade da ciência.
No entanto, não existe apenas um método, mas vários métodos de análise cada qual utilizado de acordo com o caráter da pesquisa que se realiza e às necessidades do cientista.
Por existir vários conceitos para o método, podemos considerar que ele é o meio pelo qual há contato entre a realidade e a teoria científica, ou seja, através dele sistematizamos o conhecimento e fazemos ciência.
Para melhor fundamentar nossa elucidação tomemos como exemplo os método dedutivo e indutivo. Tanto o primeiro como o segundo suscitam questões e conclusões do particular para o geral e vice-versa.
Segundo LAKATOS & MARCONI (1989): “... se nos dedutivos, premissas verdadeiras nos levam a conclusões verdadeiras, nos indutivos, conduzem apenas a conclusões prováveis”.
O método é limitado tanto como meio de adequar-se à análise de uma realidade, como também pode estar divorciado de qualquer fundamento real. Pois se partimos de teses falsas chegaremos à conclusões errôneas. Além disso, todo cientista está inserido em uma cultura e estrutura social, assim toda interpretação que ele faça da realidade será condicionada pela instância cultural-ideológica, pelo sistema político-social ou pela formação ético-religiosa.
Não podemos atribuir ao método científico convencional uma preeminência que na realidade não possui.
Segundo GARAUDY (1980):
"O Positivismo não conseguiu fugir aos problemas. O idealismo não conseguiu resolvê-los. Esses problemas, (...), decorrem do malogro de um duplo dogmatismo: o da religião e do cientificismo. (Perspectivas do Homem p.13)."
Para concretizar a harmonia entre religião e ciência há necessidade de se romper esse duplo dogmatismo. Se de um lado acreditamos que a Revelação Bahá’í possui os meios de rompimento com o dogmatismo religioso de outro no plano da ciência devemos não perder de vista que a discussão teórica metodológica é vital para fundamentar o argumento perante uma nova interpretação do processo temporo-espacial e o papel da religião como direcionadora deste.
Segundo ‘ABDU’L-BAHÁ (19__):
"Las exigências del presente piden nuevos métodos de solución; los problemas del mundo son sin precedente. Las vejas ideas y formas de pensamiento están rápidamente tornándose anticuadas.(Fund de La Unidad Mundial p.141) "
A aplicação do método científico convencional na Religião não concretizará a interação possível entre ciência e religião. Porque o método científico de origem racionalista cartesiana e recriado sob o racionalismo idealista do positivismo é incapaz de oferecer uma resposta adequada ao fenômeno da religião.
O Positivismo que de modo avassalador permeia as ciências tende a deificar a ciência, negar o propósito da religião enquanto ,uma verdade revelada reforçando um sentimento de antireligião e um idealismo desvinculado da existência de uma Divindade. Sob todos os aspectos esta ideologia é contrária as verdades inculcadas em qualquer religião histórica revelada.
Segundo SCIACCA (1968):
A ciência é entendida por ele como a revelação do ser, o progressivo realizar-se do Infinito, a solução de todos os problemas, a instauradora de uma nova ordem social.
Em suma, a Ciência não é apenas o único conhecimento humano, mas é a ‘nova religião da humanidade’, que torna supérfluas todas as religiões tradicionais e é a garantia infalível do melhor destino do homem, como indivíduo e como membro da sociedade. A moral a política, a religião, toda a atividade humana é canalizada à ciência, a grande esperança, a soberana possibilidade do homem, o ideal novo não deludente. A nova sociedade técnica industrial tem o seu fundamento e a sua garantia na ciência. O ‘otimismo’ positivista, ingênuo e romântico, instaura o culto religioso da própria ciência e, ao invés de ter dela um conceito crítico, tem-na num mito e numa superstição. (...); para os positivistas tudo é ciência, inclusive a filosofia e a própria religião. (...); ‘cientismo’ abstrato... Inimigo de toda metafísica, o positivismo é também ele uma metafísica, que se lança até a adoração do fato e à deificação da matéria. (Hist. da Filos. M.F.Sciacca p.143 - III 1968 - Ed Mestre Jou SP).
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