Autor: Frei Boaventura
Vale a pena assinalar a diferença que há entre “verdade de fé” (“dogma”) e “doutrina da Igreja” (que não é necessariamente nem “dogma” nem imutável). É óbvio que as verdades de fé, devidamente propostas, são também doutrina da Igreja. Porém nem toda doutrina da Igreja, mesmo as que são severamente propostas e mantidas, são verdades de fé. Como o Concílio Vaticano II parecia estar produzindo quantidade de documentos, surgiu a questão do valor ou da qualificação teológica destes ensinamentos conciliares. Na Comissão teológica do Concílio, na qual eu trabalhava, esta questão surgiu várias vezes. Então no dia 25-10-1963 a comissão aprovou a seguinte fórmula: “Tendo em conta o costume conciliar, este Concílio define somente aquilo que deve ser mantido em matéria de fé e de costumes e que o Concílio indica claramente. Por isso aquilo sobre o qual o Concílio não o declarar não é definido pelo Concílio [como verdade de fé ou dogma], mas exposto pelo autêntico Magistério como doutrina da Igreja”. Observe-se bem: pode haver “doutrina da Igreja” proposta pelo autêntico Magistério, depois de muita discussão, até mesmo num Concílio Ecumênico.
Aparece, pois, a expressão “doutrina da Igreja” como algo bem diferente da “fé da Igreja”. Esta fórmula foi no dia seguinte comunicada aos Moderadores do Concílio. Portanto é dito que o próprio Magistério autêntico pode propor algo como “doutrina da Igreja” mesmo quando não a entendam proclamar com um ato definitivo, quer dizer: sem que seja infalivelmente definido. E por conseguinte tal doutrina pode em alguns casos ser modificada ou até anulada pelo mesmo magistério autêntico que a propoz. Isso faz parte do dever ou do poder de governar. Mas o fato de um texto não ser infalivelmente definido não significa que não precisa de ser aceito e respeitado. Todas as verdades que têm uma premissa não revelada também não podem ser definidas como verdades de fé, mas nem por isso podem ser modificadas ou abolidas por qualquer cristão, mesmo que seja Bispo. Certa corrente da teologia da libertação fazia questão de partir de uma premissa não revelada: a situação dos pobres. Neste caso podia haver “doutrina da Igreja” mas não dogmas de fé e, mudada a premissa não revelada, a doutrina poderia ou até, em alguns casos, deveria ser modificada ou abolida.
(Site da Diocese de Novo Hamburgo)
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