Marcelo Natividade*
Religião e sexualidade: convicções e responsabilidades, organizado por Emerson Giumbelli, 181 p. Ed. Garamond.
Como diferentes religiões lidam com o tema da sexualidade na sociedade contemporânea? Como importantes bandeiras da luta pelos direitos sexuais, como a união civil entre pessoas do mesmo sexo e o direito ao aborto, são contempladas por certas crenças religiosas? Quais os limites de interferência da religião nas esferas pública e política no que se refere ao exercício da sexualidade e à conquista dos direitos sexuais? O livro polemiza estas e outras questões com textos que reproduzem o discurso de religiosos, em seminário dedicado ao diálogo entre distintos atores sociais (religiosos, acadêmicos e ativistas).
A publicação permite antever um panorama de posicionamentos doutrinários contemporâneos não contemplado em pesquisas no Brasil, assinalando as formas de regulação da sexualidade em contextos religiosos. As mudanças recentes apresentam-se no contraste entre perspectivas hegemônicas e minoritárias. Tensões são evidenciadas, relativas aos direitos humanos e ao exercício da sexualidade. Por exemplo, enquanto a Igreja Católica mantém a condenação oficial de práticas abortivas e uso de contraceptivos, como os preservativos, cresce o número de mulheres pobres que morrem em situações de aborto clandestino. O discurso religioso cristão – em uma perspectiva hegemônica – se apresenta com uma grande carga de concepções morais apesar de propagar a idéia de ‘acolhida’ de homossexuais: são difundidas nesse universo representações que caracterizam as práticas homossexuais como “pecado”, “anormalidade” e comportamento que se opõe ao “plano divino”. O aborto permanece como tema tabu em diferentes cenários religiosos, quase sempre condenado, a partir da valorização e respeito à vida humana. O embate travado em torno da proposta evangélica de reversão da homossexualidade por meio de terapias e/ou conversão religiosa ressalta a complexidade da articulação entre religião e sexualidade.
Homossexualidade, aborto e AIDS: convicções e responsabilidades
O primeiro conjunto de textos (Religião e seus posicionamentos I) aborda a aceitação/condenação da homossexualidade em distintas perspectivas religiosas, chamando a atenção pra o conservadorismo das doutrinas quando o assunto é sexualidade.
A posição oficial da Igreja Católica é contrária à prática da homossexualidade, principalmente a partir de um posicionamento acerca da legitimidade do projeto de Parceria Civil: “a Igreja Católica não admite que se façam comparações entre a união entre pessoas do mesmo sexo e o matrimônio no sentido cristão do termo”. Por outro lado, o catolicismo comporta posturas mais flexíveis no convívio cotidiano entre fiéis e sacerdotes, como mostra o sacerdote franciscano Antônio Moser, ao comentar sobre a crescente sensibilidade pastoral para o atendimento a homossexuais no Brasil.
Outro posicionamento cristão abordado é o da Igreja Anglicana, que concebe a homossexualidade como “incompatível com as Sagradas Escrituras”. Nesse sentido, a Diocese Anglicana do Recife chega a proibir a ordenação de clérigos homossexuais ou de heterossexuais “que defendam a normalidade da opção homoerótica”. A Igreja Presbiteriana no Brasil (em uma perspectiva hegemônica) também condena a homossexualidade como “pecado”, alinhada a outras denominações protestantes, portadoras de uma ética sexual puritana centrada em perspectiva literalista da Bíblia. Já a visão do espiritismo kardecista considera a existência de uma trajetória do espírito em sucessivas vidas. A teoria da reencarnação compreende a homossexualidade como uma tendência/personalidade adquirida em experiências vivenciadas em diferentes encarnações. Do ponto de vista dos ensinamentos doutrinários, a homossexualidade pode ser significada também como uma “prova”, possibilidade de “educação dos sentimentos” através dos sofrimentos e lutas interiores.
A segunda seção (Religião e seus posicionamentos II) apresenta uma perspectiva mais ampla, incluindo a discussão sobre o aborto. Também destaca os posicionamentos favoráveis à homossexualidade. A atuação da ONG feministaCatólicas pelo direito de decidir, chama a atenção para a pluralidade de pensamentos no catolicismo, e assinala os conflitos que se estabelecem entre forças conservadoras e progressistas. No interior de uma Igreja que sustenta firmemente sua posição combativa ao aborto, surge como uma voz dissonante que defende a descriminalização e legalização do aborto. Outro discurso minoritário é o de igrejas protestantes “liberais” como a Igreja Presbiteriana Bethesda de Copacabana, no Rio de Janeiro, que “aceita” a homossexualidade a partir da proposta de uma igreja inclusiva e liberal. Já o culto afro-brasileiro aparece como religião mais flexível à presença de homossexuais.
Os textos da terceira seção (Experiências e propostas em redes religiosas) consistem em relatos de líderes religiosos sobre pastorais de atendimento a pessoas com Aids e homossexuais e também de pesquisadores-ativistas em trabalhos de prevenção à Aids e outras DSTs. O grupo ecumênico Convivência Cristã abriga pessoas que se sentem excluídas de espaços religiosos que condenam a homossexualidade, permitindo a possibilidade de conciliação entre opção sexual e exercício da fé religiosa. No caminho oposto, perspectivas religiosas de vertente evangélica/protestante como o Corpo de psicólogos e psiquiatras cristãos, prometem a reversão da homossexualidade por meio de terapias e/ou conversão. Nesse sentido, a psicóloga religiosa Rosângela Justino polemiza ao afirmar que “há pessoas em todo o Brasil procurando apoio para sair da homossexualidade”.
O catolicismo é enfocado através do relato de iniciativas que acolhem portadores de HIV. O padre Valeriano Paitone, criador de casas de apoio a pessoas vitimizadas pela Aids, critica o moralismo oficial da Igreja e ressalta a responsabilidade das religiões em favor dos direitos humanos. Para ele, a Igreja deveria rever sua posição sobre temas que ainda considera tabu, como a Aids – o que permitiria que muitos trabalhos realizados com desviantes da norma religiosa saíssem da clandestinidade. Destaco ainda nesta seção, os relatos dos pesquisadores Luis Felipe Rios e José Marmo sobre representações da sexualidade entre adeptos do candomblé, cuja proposta interventiva é voltada à formação de sujeitos sexuais.
O desafio dos direitos humanos
O livro debate e explicita a complexidade da tarefa de promoção de um diálogo entre diferentes visões de mundo. Perspectivas doutrinárias e cosmológicas estão em jogo, em diálogo com tradições religiosas. Valores caros à promoção dos direitos humanos, como respeito à diversidade sexual e a não estigmatização das minorias sexuais, indicam a necessidade premente de indagação sobre as formas de abordagem e de regulação da sexualidade em discursos religiosos. Indo além, questionam as conseqüências sociais e políticas de tais posicionamentos. O desafio que aqui se coloca diz respeito ao impasse referente a conciliar diferentes convicções com as responsabilidades sociais em questão. A leitura do livro é um bom ponto de partida aos interessados no tema, por proporcionar um panorama geral e apresentar as tendências contemporâneas religiosas sobre a sexualidade.
* Doutorando em Antropologia Social pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ. |
( VÍDEOS SOBRE SEXUALIDADE ):
https://youtu.be/ho-iGFctXe8 (Música: Amor e Sexo/Rita Lee)
nome:Maria Daiane de Souza Monteiro n:35 9 a manhã
ResponderExcluirEscola:Creusa do carmo Rocha
eu gostei muito do texto em destaque nos da uma explicação q nos esclarece muita coisa sobre sexualidade e religião!
nome:matheus souza ximenes n:38
ResponderExcluirescola:creusa do carmo rocha
é um texto muito explicativo q nos explica muito bem sobre esse assunto e ajudar muito a entender mais sobre isso!
nome:Bruno albuquerque do santos n:06
ResponderExcluirescola:creusa do carmo rocha
serie:9*A tarde
esse texto deixa as pessoas gostem mais do assunto
e leiam mais sobre esse assunto!!!!